Marcelo Henrique G
ā2 Coelhosā Ć© um daqueles filmes que parecem querer escapar de qualquer definição simplista. A primeira sensação ao terminar a sessĆ£o nĆ£o Ć© exatamente de satisfação imediata, mas de uma inquietação curiosa: o que eu acabei de ver? E por que, mesmo com tantos excessos, tantos saltos e tantos recursos aparentemente exagerados, o filme pareceu nĆ£o apenas me prender, mas tambĆ©m me obrigar a repensar a própria forma como o cinema brasileiro pode dialogar com o pĆŗblico?
A obra dirigida por Afonso Poyart mergulha numa narrativa que, em muitos momentos, beira o caótico, mas que justamente no caos encontra sua forƧa. Ć como se fosse uma colagem pós-moderna de referĆŖncias cinematogrĆ”ficas que jĆ” conhecemos bem ā do cinema frenĆ©tico de Guy Ritchie Ć violĆŖncia estilizada de Tarantino, passando pelo ritmo publicitĆ”rio que remete a videoclipes e comerciais de televisĆ£o. Essa mistura, longe de ser gratuita, serve a um propósito: nos fazer experimentar um Brasil cinematogrĆ”fico que ousa se afastar do realismo cru, tĆ£o comum em nossa filmografia, para apostar em uma estilização quase lĆŗdica da violĆŖncia e da criminalidade.
O enredo acompanha Edgar, vivido com intensidade por Fernando Alves Pinto, um homem envolvido numa trama de vinganƧa que mistura corrupção, crime organizado e justiƧa pelas próprias mĆ£os. Mas seria reducionista resumir 2 Coelhos apenas como um filme sobre vinganƧa. A verdade Ć© que a narrativa se constrói como um jogo de espelhos: nada Ć© entregue de forma linear, tudo Ć© fragmentado, mostrado em pedaƧos, costurado depois em retrospecto, como se o diretor quisesse nos lembrar a todo instante de que o cinema tambĆ©m Ć© manipulação de tempo e memória. Essa escolha estĆ©tica pode incomodar alguns, mas para outros ā e eu me incluo nesse grupo ā cria um prazer quase intelectual em ir juntando as peƧas, em ser ativo dentro da experiĆŖncia, e nĆ£o apenas um espectador passivo.
A fotografia e a montagem talvez sejam os elementos mais marcantes da obra. Ć impossĆvel nĆ£o notar como cada quadro parece pensado para provocar impacto visual. HĆ” um uso quase obsessivo da cor, dos contrastes, da sobreposição de imagens, das inserƧƵes grĆ”ficas que lembram HQs ou videogames. Alguns diriam que hĆ” exagero, e nĆ£o nego, mas Ć© um exagero que dialoga com a proposta de um cinema que nĆ£o quer ser discreto, que nĆ£o deseja passar despercebido. Ć como se Poyart gritasse para o pĆŗblico: āOlhem para mim, o cinema brasileiro tambĆ©m pode ser cool, tambĆ©m pode ser pop, tambĆ©m pode ser adrenalina pura!ā.
Nesse sentido, 2 Coelhos me parece um filme manifesto. Ele nĆ£o Ć© apenas uma história contada; Ć© uma declaração estĆ©tica. Ć um tapa na cara de quem ainda associa nossa produção audiovisual a fórmulas engessadas, a dramas sociais excessivamente sĆ©rios ou a comĆ©dias populares que subestimam a inteligĆŖncia do espectador. Poyart se arrisca ao criar algo que poderia ser visto como um hĆbrido maluco, mas que, justamente por esse risco, ganha autenticidade.
Claro que nem tudo sĆ£o flores. A narrativa, com tantas idas e vindas, corre o risco de cansar ou de se perder em sua própria ambição. HĆ” momentos em que a verborragia visual parece querer ofuscar a emoção genuĆna da trama. Ainda assim, mesmo nos excessos, percebo uma sinceridade criativa, um desejo de inovar que nĆ£o se rende ao medo do julgamento. E isso, para mim, jĆ” Ć© algo admirĆ”vel.
Outro aspecto que merece destaque Ć© a forma como o filme lida com o contexto brasileiro. Ao mesmo tempo em que bebe de referĆŖncias estrangeiras, ele nĆ£o se aliena da nossa realidade. O cenĆ”rio de corrupção polĆtica, a presenƧa do crime organizado, a sensação de impunidade e injustiƧa sĆ£o elementos profundamente enraizados na vida cotidiana do paĆs. O filme, entĆ£o, nos dĆ” um espelho distorcido, estilizado, mas ainda assim reconhecĆvel. Ć como se dissesse: āEssa nĆ£o Ć© a sua realidade literal, mas Ć© um reflexo possĆvel dela, amplificado, exagerado, transformado em espetĆ”culo, mas ainda dolorosamente familiar.ā
Quando penso em 2 Coelhos, penso tambĆ©m no impacto que ele teve dentro do cinema nacional. Ele nĆ£o apenas arrecadou atenção, mas abriu espaƧo para discussƵes sobre novos caminhos estĆ©ticos. NĆ£o Ć© exagero dizer que ele mostrou que o pĆŗblico brasileiro pode, sim, consumir um produto cinematogrĆ”fico ousado, veloz, āgringoā em estilo, mas sem perder sua raiz local. Talvez nĆ£o seja um filme perfeito ā e poucos sĆ£o ā, mas Ć© um filme importante.
No fim, assistir a 2 Coelhos Ć© aceitar embarcar em uma montanha-russa que nĆ£o se preocupa em ser confortĆ”vel. Ć aceitar ser desafiado por uma narrativa fragmentada, por uma estĆ©tica ruidosa, por um excesso que Ć s vezes sufoca, mas que no fundo pulsa vida. Ć um cinema que nĆ£o pede desculpas por ser ousado. E, gostemos ou nĆ£o, Ć© justamente esse gesto de ousadia que faz dele uma obra memorĆ”vel, daquelas que, mesmo anos depois, ainda ecoam na memória, seja pelo estilo inconfundĆvel, seja pelo incĆ“modo que provoca.
Rated 3.5/5 Stars •
Rated 3.5 out of 5 stars
08/21/25
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Audience Member
2 Coelhos is a surprisingly good Brazilian crime drama.
Rated 4/5 Stars •
Rated 4 out of 5 stars
02/16/23
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Audience Member
The story is very interesting! It is a action movie but at the end you are perplexed reflecting about the message like in some drama movies as well. Great sound track and visual effects. Unique in many aspects!
Rated 5/5 Stars •
Rated 5 out of 5 stars
01/20/23
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Audience Member
A very unique movie that really kept me hooked. This movie had a unique style of editing and cinematography that I highly enjoyed. Some other things to point out are the great dialogue,sfx,editing, and soundtrack. Overall this is a film that delivers.
Rated 4/5 Stars •
Rated 4 out of 5 stars
01/30/23
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Audience Member
Apesar do final idiota e das firulas...
Rated 4/5 Stars •
Rated 4 out of 5 stars
01/23/23
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Audience Member
Roteiro legal com desenvolvimento surpreendente, efeitos com animaƧƵes de qualidade e trilha sonora muito boa. Curti e recomendo!
Rated 4/5 Stars •
Rated 4 out of 5 stars
01/31/23
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